Agravo em recurso especial nº 220.138 - RN (2012/0176183-7)
Relator: Ministro Marco Buzzi
Agravante : Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte
Agravado : s f de a l m e outro advogado : Pedro Luiz Viana Lopes e outro (s) interes. : a e da s c (menor) repr. por : l g l da s c decisão
Cuida-se de agravo (artigo 544 do CPC), interposto por Ministério Público do Estado do Rio Grande do Norte, em face de decisão que inadmitiu recurso especial, a qual, em autos de ação de adoção, deu provimento à apelação a fim de anular a sentença e determinar novo julgamento do feito, porquanto reconheceu estarem presentes as condições da ação.
O apelo extremo fundamento no artigo 105, inciso III, alínea a da Constituição Federal, desafia decisão prolatada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Norte, cuja a ementa possui o seguinte teor (fl. 334): Civil e processual civil, apelação cível. Ação de adoção com pedido de antecipação de tutela. Sentença que extinguiu o feito sem resolução de mérito por inépcia da inicial e impossibilidade jurídica do pedido. Ausência de inscrição no cadastro nacional de adoção. Princípio da proteção integral. Edição da lei federal n. 12.010/09. Previsibilidade de adoção consentida. art. 166 do eca. art. 50, § 13, do eca. Ausência de antinomia. Interpretação sistemática. Desnecessidade de inscrição prévia em cadastro face à peculiaridade do caso concreto. Presença das condições da ação. Sentença anulada. Precedentes do STJ e desta corte de justiça. Conhecimento e provimento do recurso. Nas razões do especial (fls. 350/357) o insurgente aponta violação aos artigos 282 e 295 inciso I parágrafo único do CPC, 39 e 50 § 13 do ECA. Sustenta, em suma, se tratar de pedido juridicamente impossível, em virtude dos recorridos não estarem previamente registrados no Cadastro Nacional de Adoção. Assevera, ainda, ser hipótese de adoção não autorizada pela lei. Ademais, afirma que não foi observado a ordem cronológica prevista no rol do dispositivo legal. Contrarrazões às fls. 362/373. A Corte Estadual inadmitiu o recurso ante a incidência do óbice da Súmula 7 do STJ.
Daí o presente agravo (fls. 386/393), o qual o insurgente, buscando destrancar o processamento do feito, refuta o óbice aplicado pela Corte local. Contraminuta apresentada. (fls. 397/402). É o relatório. Decido. A insurgência não merece prosperar. 1. No que concerne à assertiva de inexistência de um dos requisitos aptos a configurar o direito de ação, ante a alegação de ausência de uma das condições da ação, verifica-se que o acórdão vergastado concluiu restar evidente a possibilidade jurídica do pedido, nessa esteira, oportuno trazer seguimento do aresto combatido: Outrossim, ressai evidente a possibilidade jurídica do pedido, eis que, sem dúvida, os autores-apelantes deduziram em juízo pedido consentâneo com o nosso ordenamento jurídico, não só com os preceitos contidos no Código Civil, no capítulo que trata da adoção, como também com as disposições elencadas sobre à matéria no Estatuto da Criança e do Adolescente - Lei n 8.069/90, pois, como dito, deve ser analisado o caso concreto trazido à juízo, visando um efetivo benefício para o adotando.
Nesse contexto, ressalto que, embora a adoção, como forma de colocação em família substituta, prevista no ECA, nos arts. 39 a 52-D, exija um procedimento personalizado, com a observância da ordem cronológica de adotantes e adotandos, estágio de convivência, acompanhamento por equipe multidisciplinar e participação do Ministério Público, albergando, outrossim, algumas exceções, insertas no art. 50, § 130, do referido Estatuto, as quais não se enquadram no caso dos autos, observo que, o presente caso, se adequa a uma das hipóteses de adoção contida no art. 166 do ECA, que se denomina de adoção consentida ou intuitu personae, na qual os pais biológicos abdicam do pater família e direcionam a criança ou o adolescente a uma pessoa previamente escolhida. (...)
No caso vertente, a criança foi entregue espontaneamente pela mãe biológica ao casal-adotante, ora recorrente, que, afirmando não saber quem era o pai da criança e não tendo condições para criá-la, consentiu, de início, com a adoção. Portanto, entendo possível não só a procedibilidade da ação de adoção, eis que, assim considerada hábil, mostra-se possível a legitimar a pretensão tal como deduzida pelos autores, ora recorrentes, como também o pedido por eles cumulado de guarda provisória todavia, observa-se a subsistência destes fundamentos inatacados nas razões do recurso especial, quais sejam, tratar-se de pedido condizente com o ordenamento jurídico, tanto com o disposto no Código Civil, quanto no ECA, e ainda, o requisito de ordem cronológica não se adequar ao caso vertente em virtude de se tratar de doação outorgada.
Motivação esta apta a manter a conclusão do aresto impugnado, impondo-se o não-conhecimento da pretensão recursal, a teor do entendimento disposto na Súmula nº 283/STF: é inadmissível o recurso extraordinário, quando a decisão recorrida assenta em mais de um fundamento suficiente e o recurso não abrange todos eles. Nesse sentido, confira-se os precedentes:
Recurso especial - seguro - embriaguez - prova - fundamento inatacado - juros moratórios - termo inicial - matéria de ordem pública. 1.- Ausente impugnação a fundamentos do acórdão recorrido, aplica-se a Súmula 283 do Supremo Tribunal Federal. [...] 3.- Agravo Regimental improvido. (AgRg no REsp 1086197/SP, Rel. Ministro Sidnei Beneti, terceira turma, julgado em 28/06/2011, DJE 01/07/2011)
Processual civil. Agravo regimental no agravo de instrumento. Falta de peça essencial à compreensão da controvérsia. Súmula 288 do STF. Recurso especial. Reexame de fatos e provas. Súmula 7 do STJ. Fundamento inatacado. Súmula 283 do STF. Recurso judicial protocolado após o encerramento do prazo. Intempestividade. Responsabilidade da parte. [...] 4. É inadmissível o recurso especial que não impugna fundamento do acórdão recorrido apto, por si só, a manter a conclusão a que chegou a Corte de origem (Súmula 283 do STF).5. Agravo regimental a que se nega provimento.
2. Além disso, o Tribunal de origem prolatou decisão em consonância com o entendimento desta Corte Superior, a qual entende que a observância da ordem de cadastramento não é absoluta, podendo ser mitigada em respeito ao princípio do melhor interesse do menor, na hipótese de existir vínculo afetivo. Nesse sentido, confira-se habeas corpus. Ação de destituição do poder familiar c/c com adoção. Determinação de acolhimento institucional. Cadastro de adotantes. Melhor interesse da criança. Ordem concedida. 1.- Não é do melhor interesse da criança o acolhimento institucional ou familiar temporário, salvo diante de evidente risco à sua integridade física ou psíquica, circunstância que não se faz presente no caso dos autos. Precedentes. 2.- A observância do cadastro de adotantes, não é absoluta. A regra legal deve ser excepcionada em prol do princípio do melhor interesse da criança, base de todo o sistema de proteção ao menor. Tal hipótese configura-se, por exemplo, quando existir vínculo afetivo entre a criança e o pretendente à adoção, como no presente caso. 3.- Ordem concedida. (HC 294.729/SP, Rel. Ministro Sidnei Beneti, terceira turma, julgado em 07/08/2014, DJE 29/08/2014)
Direito civil. Família. Relação de parentesco. Adoção. Busca e apreensão de menor. Suspeita de simulação. Medida socioeducativa de acolhimento institucional. Habeas Corpus. 1. O Estatuto da Criança e do Adolescente-ECA, ao preconizar a doutrina da proteção integral (artigo 1º da Lei n. 8.069/1990), torna imperativa a observância do melhor interesse da criança. As medidas de proteção, tais como o acolhimento institucional, são adotadas quando verificada quaisquer das hipóteses do art. 98 do ECA. 2. No caso em exame, a avaliação realizada pelo serviço social judiciário constatou que a criança E K está recebendo os cuidados e atenção adequados às suas necessidades básicas e afetivas na residência do impetrante. Não há, assim, em princípio, qualquer perigo em sua permanência com o pai registral, a despeito da alegação do Ministério Público de que houve adoção intuitu personae, a chamada "adoção à brasileira", ao menos até o julgamento final da lide principal. 3. A hipótese dos autos, excepcionalíssima, justifica a concessão da ordem, porquanto parece inválida a determinação de acolhimento de abrigamento da criança, vez que não se subsume a nenhuma das hipóteses do art. 98 do ECA. 4. Esta Corte tem entendimento firmado no sentido de que, salvo evidente risco à integridade física ou psíquica do infante, não é de seu melhor interesse o acolhimento institucional ou o acolhimento familiar temporário. 5. É verdade que o art. 50 do ECA preconiza a manutenção, em comarca ou foro regional, de um registro de pessoas interessadas na adoção. Porém, a observância da preferência das pessoas cronologicamente cadastradas para adotar criança não é absoluta, pois há de prevalecer o princípio do melhor interesse do menor, norteador do sistema protecionista da criança. 6. As questões suscitadas nesta Corte na presente via não infirmam a necessidade de efetiva instauração do processo de adoção, que não pode ser descartado pelas partes. Na ocasião, será imperiosa a realização de estudo social e aferição das condições morais e materiais para a adoção da menor. Entretanto, não vislumbro razoabilidade na transferência da guarda da criança - primeiro a um abrigo e depois a outro casal cadastrado na lista geral -, sem que se desatenda ou ignore o real interesse da menor e com risco de danos irreparáveis à formação de sua personalidade na fase mais vulnerável do ser humano. 7. Ordem concedida. (HC 279.059/RS, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, quarta turma, julgado em 10/12/2013, DJe 28/02/2014) 3. Do exposto, amparado pelo artigo 544 § 4º inciso II, alínea b do CPC, conheço do agravo, paranegar seguimento ao recurso especial. Publique-se Intimem-se Brasília (DF), 25 de maio de 2015. Ministro Marco Buzzi Relator.
(STJ - AREsp: 220138 RN 2012/0176183-7, Relator: Ministro MARCO BUZZI, Data de Publicação: DJ 05/06/2015)