Apelação cível. Civil e processual civil. Ação de reconhecimento post mortem de união estável homoafetiva c/c petição de herança. - procedência na origem.
(1) Partilha. Não inclusão na rubrica "dos pedidos". Inserção nas alegações. Interpretação lógico-sistemática. Pretensão versada.
A petição inicial merece interpretação lógico-sistemática, não sendo adequado seccioná-la por tópicos. Assim, devem ser considerados todos os requerimentos feitos ao longo do petitório, inclusive os implícitos, ainda que não localizados no item "pedidos". Daí decorre a higidez da decisão que acolhe pleito constante do bojo da exordial, até porque mais consentânea com a garantia de máxima efetividade ao direito de ação. Inteligência dos arts. 2º, 128, 262, 293, primeira parte, e 460 do CPC; e 5º, inc. XXXV, da CRFB; e da principiologia processual.
(2) União estável homoafetiva. Requisitos configurados. Reconhecimento bem lançado.
A união estável é entidade familiar protegida pelo Estado, configurando-se na convivência dotada de: a) publicidade; b) continuidade; c) estabilidade; e d) objetivo de constituir família, dispensando-se a dualidade de sexos, em leitura sistemática do ordenamento jurídico hodierno, por se dirigir a proteção estatal à tutela do afeto consubstanciado na solidariedade familiar, independente de sua composição de gênero. Dessa forma, demonstrados os referidos pressupostos por quem pleiteia o seu reconhecimento, enquanto fato constitutivo de seu direito, e não aportados fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito, imperativa é a manutenção da procedência exarada. Inteligência dos arts. 333 do CPC; 1.723, caput, do CC; e 1º, inc. III, 3º, incs. I e IV, e 226, caput e § 3º, da CRFB.
(3) Regime sucessório. União estável. Art. 1.790 do cc. Inconstitucionalidade. Art. 1.829 do cc. Aplicação por analogia.
O art. 1.790 do Código Civil, que estabelece o regime sucessório na união estável, é inconstitucional, pois: a) estabelece, sem que presente discrímen legítimo, diferenciação entre a união estável e o casamento, nada obstante ambas sejam entidades familiares escoradas em afeto de idêntica valia e sob igual tutela protetiva estatal; b) ofende o princípio da igualdade filial ao ensejar consequências diferenciadas à prole a depender de sua origem; c) pretere o companheiro em desfavor de outros parentes sucessíveis, ferindo-lhe a dignidade e o direito fundamental à herança, em previsões expurgadas de proporcionalidade e razoabilidade; e d) mitiga a proteção sucessória do companheiro assegurada por diploma anterior, ferindo o princípio do não retrocesso social. Assim, ausente norma disciplinadora aplicável, faz-se cabível a incidência, por analogia, do art. 1.829 do Código Civil, que delineia o regime sucessório no casamento. Inteligência dos arts. 4º da LINDB; 126 do CPC; 1.790 e 1.829 do CC; e 1º, caput e inc. III, 3º, incs. II a IV, 5º, incs. XXX, XXXVI e LIV, 226, caput e § 3º, e 227, § 6º, da CRFB.
Em se aplicando à união estável o regime da comunhão parcial de bens, por subsidiariedade, em razão da ausência de contrato escrito entre as partes, além da meação garantida ao companheiro sobrevivente sobre os bens adquiridos onerosamente na constância da união estável, inexistindo descendentes e ascendentes, garante-se-lhe, a título de herança, também a totalidade da meação do de cujus, na extensão dos bens comprovados, enquanto fato constitutivo de seu direito, como enquadráveis em tal condição, desde que não derruída esta, pela parte adversa, com fatos impeditivos, modificativos ou extintivos, tornando, assim, imperativa a manutenção da procedência exarada. Inteligência dos arts. 333 do CPC; e 1.658 a 1.666, 1.725 e 1.829 do CC.
Sentença mantida. Recurso desprovido.
(4) Petição de herança. Cabimento. Procedência acertada. (TJSC, AC Nº 2013.084018-1, Relator: Henry Petry Junior, 5ª Câmara Cível, J. 21/01/2016).